“OLHA
PRO CÉU MEU AMOR"
Essa música acompanhou os meus
verdes anos. Sempre no mês de junho as letras que homenageiam Santo Antonio, São
João e São Pedro saíam das gavetas e das casas do interior para as salas das
cidades. Nessa época todos se irmanavam num sentimento único, celebrar os
santos que enchiam de alegria e esperanças crianças, rapazes e moças, novinhas
ou “moças velhas”, donzelas – comum naquele tempo – e senhoras.
Olhar para o céu mais que à
procura da lua, demonstrava o quanto a jovem estava ansiosa por ter alguém com
quem dividir aquele sentimento que a incomodava. Não sabia de que se tratava,
suspiros, suspiros, suspiros. De repente não cabia dentro de si. Estava
chegando o dia dos namorados, as coleguinhas correndo em busca de presentes e
ela sozinha, que maldade, como pode?
Dúvida cruel, aceitar aquele
pretendente que não fazia o seu coração acelerar somente para não estar só? Ou
insistir em lançar olhares para aquele que “fingia” (é claro que ele via) não
perceber sua emoção, seu atrapalho e todo o vermelho que enchia o seu rosto
cada vez que ele se aproximava?
Dependia do seu estado de
espírito a decisão. Estava dividida. Ora achava que devia tentar aquele, o dito cujo que não
perdia oportunidade de demonstrar o seu interesse. Ora dizia a si mesma que não
valia a pena. E se estivesse namorando e de repente o outro se manifestasse
nesse sentido?
Oh céus, oh dor. Que fazer?
Olhar para a lua e suspirar. Santo Antônio já se fora, com direito a trezena e
tudo. Vestir-se com esmero,
cuidadosamente verificar cada detalhe. A roupa teria que deixá-la mais bonita,
mostrar escondendo, para não tornar-se vulgar. Um decotinho ali, a cintura fina
e marcada, o comprimento somente acima do joelho, cores bonitas, modelo chique.
Os sapatos com salto alto,
bonito, porém confortável. Nada tira mais a cadência do andar que um sapato
incômodo. Maquiagem e cabelos com requinte, bonitos, sem exageros.
Aparentemente a moça estava pronta, não
só pra olhar o céu, mas para encontrar
alguém com quem dividir o olhar.
Faltava algo, o que seria? No
vestir tudo certo. O que dizer se o galã resolvesse se aproximar queimava a
ponta da língua, fora ensaiado inúmeras vezes. Quem sabe o perfume. Não esse
era o ideal – Fleur de Rocaille – da Caron, perfumaria antiga, francesa e de
excelente aceitação no mercado. Estava linda, elegante e cheirosa. Por que
então a insegurança?
A Lua tão linda, o céu riscado
por fogos de artifícios, as fogueiras esquentando tudo, inclusive os corações,
crianças correndo para cima e para baixo. Bombinhas, chuveiros, traque, faziam
a alegria dos menores. Os pré-adolescentes divertiam-se soltando bombas bujão e
fogos que uma vez disparados se dividiam no céu em lagrimas de cores múltiplas.
Uma beleza.
Aquela sensação esquisita da
ausência de algo que ainda não sabia o que era. Olhando já percebera a
presença, no pavilhão, daqueles dois: o pretendente e o pretendido. O primeiro
era bonito, de olhos verdes e, grande amigo; o segundo, sequer era bonito, mas
tinha um quê, provocava confusão, desordem na criatura, apesar de estar sempre
com uma atitude distante, denotando total desinteresse.
Assim, de repente, como todas
as boas idéias, a lua no céu provocou o que havia de mais bonito na garota. O
seu rosto iluminado pelo reflexo lunar ficou radiante, começara a rir. E o riso
era cristalino, transformava sua face. Ninguém sabia, mas ria de si mesmo, do
quanto era boba. Como alguém pode se interessar por outra pessoa que sequer
olha para ela?
Sorrindo, com a alegria de quem
não tem recalques, viu algo muito estranho acontecer. O jovem, que sempre a
esnobara, aproxima-se e diz: você está linda. Não tinha percebido ainda que se
transformara numa bela moça. Sempre lhe admirei, mas a considerava uma criança.
Vejo que me enganei.
Ela, patética ouvindo aquela
torrente de elogios. Não era possível, era um sonho. Efeito da magia que
envolvia o mês de junho. Não era normal algo assim acontecer. Como quem não
quer nada vem a frase: sabe que o sorriso lhe torna mais bonita ainda e que enche
a rua de luz? Como? É isso que eu disse, seu riso irradia luz.
Embevecida com os elogios não
se dá conta de que ela é que era a estrela naquele momento. Para sua surpresa
as atenções voltaram-se para ela. O patinho feio desabrochara, era, agora, uma
moça bela, sorridente e assustada.
O charmoso que mexia com seu
equilíbrio, tão ao seu alcance, perdera um pouco do brilho. No meio dos rapazes
e moças alguém ganhou destaque, não era o amigo ou mesmo o ex-pretenso futuro
namorado. Alguém calado, de olhos apertados e que não estava acostumado a
dedicar sua atenção a aquela jovem, muito jovem por sinal para aquele aluno de
tradicional colégio para rapazes, todo perfumado e que, diferentemente dela, já tivera namoradas.
Pois é, o até então príncipe virou sapo, foi eliminado.
Em seu lugar surgiu um novo rosto. Foram necessários meses, quase um ano, até
que para a jovem surgiu o, hoje desusado, pedido de namoro. Diverso do que ocorre
no presente, foi um período de aprendizagem, tudo era novo, pegar na mão, a mão
no ombro, caminhar de mãos dadas, beijar o rosto, os olhos , até, roubar beijos na boca, foi uma aventura
construída a partir de um impulso, aceitar namorá-lo.
Assim olhar a lua passou a ter
um novo componente. Não era mais preencher um vazio, era ver a beleza,
sentir-se banhada de prata, compartilhar a deliciosa aura que envolve os
namorados pois como diz o cancioneiro
popular “ a lua é, é, dos namorados”.
A super lua, particularmente
bonita sobre as águas de Manaíra, com certeza causou em muita gente um efeito
avassalador, distribuiu amor, fez renascer sentimentos adormecidos, relembrou
fatos e histórias de namoros abençoados por esse astro feminino.
Em mim e para mim há algo
especial quando a lua brilha enorme, fulgurante; tanto faz se nasce por detrás
da serra ou sobre as águas do mar, pode
funcionar como um amuleto, um afrodisíaco, qualquer coisa, menos passar em
brancas nuvens. A lua cheia traz consigo força, mistério, magia e sedução.
Desequilibra homens, mulheres, animais, é um doce e maravilhoso mistério. Ah, ia esquecendo de dizer-lhes, nasci em
dezenove de julho, sou de câncer, signo regido pela lua...
Um comentário:
Sempre emocionando...
Gostaria de sentir o perfume de Fleur de Rocaile... desde o filme Perfume de Mulher e seu impressionante Tenente Coronel Frank Slade...
Beijo D. Lurdinha
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