Quem sou eu? O que faço

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João Pessoa, Paraíba, Brazil
Quem sou? O que faço. Sou Maria de Lourdes, tenho, agora, 62 anos, esposa, mãe e avó, formação jurídica, com pós graduação em Direitos Humanos e Direito Processual Civil, além de um curso não concluído de Filosofia. Conheci os clássicos muito cedo, pois não tinha permissão para brincar na rua. Nosso universo – meu e de meus irmãos – era invadido, diariamente, por mestres da literatura universal, por nossos grandes autores, por contistas da literatura infanto-juvenil, revistas de informação como Seleções e/ou os populares gibis. Todos válidos para alimentar nossa sede de conhecimento. Gosto de conversar, ler, trabalhar, ouvir música, dançar. Adoro rir, ter amigos e amar. No trabalho me realizo à medida que consigo estabelecer a verdade, desconstruir a mentira, fazer valer direitos quando a injustiça parece ser a regra. Tenho a pretensão de informar, conversar, brincar com as palavras e os fatos que possam ser descritos ou comentados sob uma visão diferente. Venham comigo, embarquem nessa viagem que promete ser, a um só tempo, séria e divertida; suave e densa; clássica e atual. Somente me acompanhando você poderá exercer seu direito à críticas. Conto com sua atenção.

sábado, 28 de julho de 2012

SEXAGENÁRIA OU SEXY ?

REFLEXÕES AOS SESSENTA.
UMA VIDA!

Sempre me questionei dos sentimentos que cercam as pessoas à medida que vêem o mundo mudar a sua volta. Indagar e escutar explicações interiores foram rotinas em minha existência. Pedir e agradecer, também. O riso frouxo, a veia cômica sempre pulsante, lado a lado com o choro fácil, a tendência ao drama, à tagarelice em contraponto a responsabilidade, a persecução de objetivos são traços de minha personalidade.

Dentre as minhas convicções uma se sobressai. A certeza de que, ao nascer mulher, a natureza me ofertou a grande opção de minha vida. Sempre me senti perfeita nessa condição. Jamais tive preocupações estéticas que viessem a tirar o brilho dessa maravilhosa experiência. Vivi, a cada tempo, todas as emoções que o gênero feminino coloca ao alcance de seus membros. 

Amei e fui amada. Acalentei dentro de mim o amor Eros. Vivi a paixão dos verdes anos e, sem traumas, consegui ir transformando sentimentos, tornando-os maduros, quase sem arroubos. Fieis as mudanças do corpo, da psique e da alma. Não existe, nesse contexto, feminil, emoções sadias e maravilhosas que eu não tenha experimentado.

Perto dos  catorze anos tive o meu primeiro namorado. Quase platônico. Assim o digo porque admitir, para mim, que estava namorando me deixava envergonhada. Esse início vivi em Santa Rita, minha pequena cidade natal. A gruta onde tantas vezes rezei pedindo a Nossa Senhora de Lourdes, Paz, Saúde e Amor para meus pais, meus irmãos e todos os meus familiares, ouviu também minhas preces compatíveis com a minha idade, com a minha Fé.

Pedi, inúmeras vezes a Santa pela Paz Mundial, pelos pobres, pelos doentes e tive, secretamente, o hábito de olhar naquela direção todas as ocasiões em que me senti, por algum motivo, desassossegada.


Desse modo elevei meu pensamento a Nossa Senhora de Lourdes rogando que não deixasse meus pais tomarem conhecimento de que eu estava namorando. Ou mesmo, me indagando sobre o fato de que tê-lo deixado pegar em minha mão pudesse me impedir de receber a Sagrada Eucaristia. O meu mundo era realmente muito diferente dos dias atuais.

Cresci. Conclui meu Curso de Direito. Casei. Me tornei mãe. Me divorciei e casei novamente. E, de repente, sessenta anos, bem vividos. Onde a tônica tem que ser o AGRADECIMENTO. Sim porque vinda de PAIS maravilhosos. Simples, honestos.

Ele, homem que iniciou sua vida como agricultor e, aos dezessete anos viu partir o seu genitor, sofreu o golpe e continuou sentido sua perda até o dia em que ele também se foi.

Ela, filha querida de um autodidata, um homem simples, modelo de honestidade e que, numa visão rara para a época a levou para estudar em colégio interno, de onde, segundo suas palavras, sairia professora e não dependeria de um marido para sobreviver.

Mas, falar sobre eles daria não uma página, duas, três....se faria necessário o resto de meus dias e quiçá a eternidade. Sim, pois a graça de ter nascido filha de Álvaro e Luzia, com certeza absoluta traçou o meu caminhar, a minha forma de ver e entender a vida. As falhas, debito-as ao livre arbítrio, as minhas possibilidades de decidir entre essa ou aquela atitude.

 O amor, a confiança, a dedicação e a paciente insistência que dedico as minhas metas podem ser atribuídas a herança genética e social dessas maravilhosas criaturas. Os erros não. Foram e são exclusivamente meus. Fazem parte de minha aprendizagem, meu crescimento como eterna aprendiz.

Entretanto e mesmo com a origem abençoada com que fui agraciada por Deus, a minha grande conquista não se revela nas razões de um pedido deferido, de um recurso provido, de uma unanimidade obtida. 


Não foi com a “beca “ a minha maior e melhor performance Com absoluta certeza o ápice de honrarias recebidas aconteceu para mim quando me tornei mãe. Este é o meu tesouro. Esta é a justificativa para a luta diária, para o progresso interior, para valorizar cada momentos, cada dia.

Nesse contexto extremamente pessoal, ser mãe sempre foi um desejo em minha existência. Desde muito cedo resolvi que se não me tornasse mãe biológica, seria por adoção. Porém não necessitei recorrer a adoção. Deus me fez mãe. Os meus filhos, dois, um homem e uma mulher. Cujo pai, Charles, não mais está entre nós. Sadios, inteligentes, amorosos, lindos aos meus olhos. Tudo o que uma mulher pode idealizar em relação à maternidade.

Primeiro, aos 28 anos, já considerada prímipara idosa, tive a felicidade de ver nascer Fred, meu filho primogênito. Nessa hora passei a dimensionar a palavra com outro significado. Eu que me acostumara a ser filha, mãe, tia...me transformara em mãe. 


Aquela criaturinha pequena, indefesa, sangue de meu sangue, carne de minha carne, trouxera para mim a mais forte experiência que se possa imaginar. Neste período vária pessoas foram importantíssimas, entre muitas: uma médica amiga, neo-natal, de nome Eugênia Emília; uma amiga transformada em mãe de leite, Ana Gláucia; “Maria Jorge” uma Senhora que há muito trabalhava na minha família e que por sua amizade e dedicação tornou-se uma grande amiga de todos nós; minha mãe, Luzia, amiga número um e companheira de todas as horas e muitas outras, familiares ou não.

No primeiro ano, como mãe, vivenciei os medos característicos de mães de primeira viagem; fiquei maravilhada ao menor gesto, ao primeiro sorriso. Com emoção vi que já se virava no berço, que já se sentava, que dava os braços pedindo colo, os primeiros passos. Tudo era beleza ante os meus olhos, tudo era festa para o meu coração.

Ao batizá-lo o vesti de calça comprida em cetim, camisa de manga longa e nervuras no peito e, uma linda gravata borboleta. Correu a Igreja toda, chamou a atenção, sorriu com o sal e chorou com água gelada da Pia Batismal enquanto os Padrinhos, Paula e Fernando sorriam apresentando-o a Comunidade Católica.

Assim foi com Fred, a quem o Pai chamava de Campeão ou de Vida e tantos outros nomes carinhosos. Mas o tempo passou, a criança cresceu, o menino sonhador, criativo, capaz de mergulhar horas num mundo imaginário povoado por criaturas fantásticas, onde a aventura o transportava, dando-lhe contentamento, paz,  se desenvolvia a olhos vistos
Um belo dia descobri: meu filho cresceu, é um homem. Constituiu sua família, trouxe-me mais uma filha, Lílian por quem agradeço todos os dias, pedindo a Deus que abençoe cada dia dessa menina que se tornou a mãe de minhas netas. Lílian, nora que em nada segue os parâmetros tradicionais de rivalidade. Uma pessoa querida, incentivadora de novos desafios, uma grande mulher. Hoje, quase transformada apenas na Mãe de Ceci e/ou, na Mãe de Carol, pelo menos para os mais novos da família. Com a chegada de Lílian veio também um novo status: virei avó.

No ano de 1982, mais uma vez fui transportada a um mundo cheio de amor, ternura, cuidados e zelo. Nasceu a minha boneca. Minha filha. Desde o seu nascimento caí de amores por aquela criança de rostinho redondo, olhos grandes e uma boca que de tão vermelha parecia ter nascido de batom. Luzia, este é o seu nome, fechou meu ciclo reprodutivo e o fez em grande estilo.

Nasceu no sertão da Paraíba, viera ao mundo quando, no oitavo mês de gestação, resolvi passear e visitar minha irmã em Santa Luzia. Sua chegada foi um tanto tumultuada, nasceu em Piancó, alto Sertão. Era tão linda que emocionava, foi crescendo e mostrando que além de linda era inteligente, comunicativa, carinhosa e tagarela. Foi batizada em Santa Luzia, vestindo uma linda camisa de batismo – branca e toda bordada. Seus Padrinhos José Álvaro e Lúcia, meu irmão e sua mulher a quem até hoje devotamos amor e carinho.

Foi crescendo, sempre cercada de primas e amigas, corria a vontade com Luíza, Juliana, Ana Zéa. Mas havia alguém que se destacava no quesito cumplicidade: Kaline, a prima com quem dividia meus perfumes, falava em código, comungava do mesmo medo de desconhecidos e da preocupação de perder entes queridos. Entre as amigas Virgínia, Lílian, Regina e Michelle. Nesse universo havia espaço para meninos, o seu irmão Fred, seu primo Alvinho, nossos vizinhos Moisés e Jorge e um pouco mais tarde Leones (Léo) que se tornaria cunhado de Fred. Hoje, lembro das vezes que enchi o carro para levá-los a um show e, na madrugada, ir buscá-los. Sempre, prazerosamente.

A menina transforma-se numa mocinha. Primeiro, houve um comportamento compatível com sua idade. Como todas aprendia músicas, adorava os “Mamonas Assassinas”, falava em paqueras. Namorar mesmo nunca me deu problemas. Um namoro rápido com um primo e vários anos tranqüila. Fiquei muito agradecida a Nosso Senhor. É que eu quando mais nova gostava, “só um pouquinho”, de namorar. Luzia, foi a adolescente que toda mãe deseja.

Já uma moça, continuou dando alegrias a mim e ao Pai. Fez sua Faculdade, concluiu seu curso e, casou. Ganhei mais um filho, Léo – Leonardo, quem o conhece sabe que não preciso gastar palavras para dizer quem ele é. Costumo dizer que é puro, diferente. 


Um rapaz bonito, sorriso largo, inteligente, dotado de uma força moral demonstrada desde o primeiro contato. Um genro que não precisou se esforçar para ser visto como um filho. Uma pessoa querida a quem entregar minha filha, um dos maiores tesouros da minha vida, foi como aninhá-la em novo e protetor abraço.

Entretanto não haveria justiça nesta reflexão se aqui não fossem incluídos os meus irmãos. Pessoas a quem dedico um grande amor. Diferentes entre si e tão iguais no trato das grandes necessidades, na afetividade e na certeza de sermos a síntese dos anos de dedicação, carinho, amor. Afeto responsável, capaz de dizer sim quando deveria e, dizer não, quando se fazia necessário. Meus irmãos, sobre quem eu costumava brincar, atribuindo aos dois primeiros às características marcantes de serem: a primogênita e o “filho homem”. Eu, a terceira, dizia, entre risos, que era fruto do   descuido, aquela que viera sem ser planejada, numa época em que o planejamento familiar era feito com a famigerada tabela.

Bom, independentemente de tal fato jamais me senti menos amada de que meus irmãos mais velhos ou mesmo do que os mais novos. Sim, porque somente para que eu não fosse a última – fechasse o ciclo da reprodução – vieram mais dois Eu me tornei a do meio. Algumas vezes ouvi minha mãe dizer: “vocês mais velhos já estão bastante crescidos para fazerem uma besteira dessa” e, no dia seguinte ouvia: “vocês, os três, são muito pequenos para tomarem decisões.....”, nessas ocasiões não conseguia processar no meu cérebro se eu já estava crescidinha ou se era uma pirralha. Dúvida cruel.

Assim são os meus irmãos, Paula, a mais velha, naturalmente séria. Competente em todos os segmentos de sua vida. Capaz de dedicar-se com afinco sob os processos da Defensoria Pública como se fosse à última chance dada na vida daquele que está sob a chancela da Lei. Sua capacidade de doar-se como mãe e mulher tornam singular o seu casamento, tendo na figura de Fernando um pai amigo para suas filhas, carinhoso, uma pessoa digna.

Suas filhas, adultas, conscientes e a exemplo de seus pais com Formação Superior sendo, respectivamente a mais velha, Representante do Ministério Publico - Fernada; a segunda, Veterinária com Doutorado - Giovanna e, a mais nova, com formação superior em Ciências Contábeis e em Ciências Jurídicas e Sociais, com Doutorado - Gabriela. Criaturas maravilhosas as quais sinto-me honrada por tê-las como sobrinhas, respeitando as características de cada uma, que vão da generosidade, passando pela saudável sagacidade e, finalmente pela persistência e competência. Assim são essas grandes garotas.

Meu irmão José Álvaro. a quem dedico um profundo sentimento. Irmão, amigo, protetor e companheiro. Sempre contei com ele nos momentos de grandes dificuldades em minha vida. Um ser humano fantástico, de memória seletiva ou, como dizem os filósofos, de esquecimento seletivo. Capaz de esquecer muitas coisas para lembrar apenas o que é importante, o que lhe é significativo.

José Álvaro que na sua missão de salvar vidas, no exercício da Medicina, conseguiu vencer sua própria natureza. Menino avesso a tudo o que denotava sofrimento. Incapaz de suportar a visão do sangue, de enfrentar as dores alheias ou as de sentido próprio. Amado e festejado não só por familiares. Na rotina de agradecimentos pessoas simples, idosos e idosas, abandonados da sorte, filhos de ninguém, criaturas de Deus, sempre com uma prece nos lábios, com boa vontade e amor no coração colocando o “Doutor” em verdadeiros pedestais por ter, em algum momento aliviado o sofrimento, ajudado a preservar dignidade, a funcionalidade, a vida

 O meu irmão cujo registro nesses sessenta anos revela responsabilidade, zelo, carinho e, acima de tudo, amor à família, aos seus, e aos que dele necessitam. Sua prole, filhas e genros, filho e nora, neta e netos, representam a continuidade da história familiar, uma marca indelével onde se repete, também, a trajetória dos pais. Nessa parte do núcleo familiar uma tendência dominante, a presença de uma Advogada/Enfermeira - a nossa Ana Carolina, cujos olhos lembram um riacho de águas claras;  uma Contadora, Ana Zéa - cujo sorriso de menina  desarma qualquer pessoa,  e um Advogado - Álvaro Neto, ex- amante de vaquejada e ora atual marido de Neudja e pai de Alvinho. Todos, brilhantes e promissores.

Socorro, minha irmã mais nova, Centrada, extremamente competente, dona de um senso de justiça que extrapola, em muito, o que se vê rotineiramente. Os seus olhos, grandes e castanhos, desde criança refletiram o grande amor que há em seu coração. Por vezes e aparentemente exigente, se o é,  inicia consigo mesma posto que perfeccionista. Como rotina busca dar o melhor de si. Sempre primando pela ética.

Nossa família, multidisciplinar no quesito profissional, com. Socorro abriu sua excursão na área de exatas. Engenheira Civil, buscou no Serviço Público Federal a sua realização. Desde a mais tenra idade demonstrou firmeza de caráter e senso de justiça. Incapaz de um gesto vazio, minha irmã sempre exigiu de si muito mais do que dos outros. Diuturnamente comprometida com os seus, com sua convicções.

Hoje, reside com sua família, marido, Carlos e filho, Iuri, em Salvador. É a que se encontra mais distante, em termos geográficos pois, no quesito assistência,  não passa um único dia sem ter contato com nossa mãe. Está  sempre presente, sempre disposta a ajudar. Acolhedora, recebe como poucos. Ser sua hóspede é ter a certeza de atenção e diversão.

Finalmente, fechando o ciclo família temos Fábio. Meu irmão mais novo com características tão próprias. Vai, em segundos da condição de muito amado a de abusado. Dono de um jeito de ser todo diferente não se reprime, fala o que sente vontade, capaz de gestos que nos leva ao desespero e ao mesmo tempo de atitudes amigas, fraternais.

Inteligente, se submeteu e foi aprovado em vestibulares como Engenharia Civil na UFPB, tendo cursado até o quarto ano; Administração, também na UFPB, sem concluir o curso e, finalmente concluiu com brilho na  primeira turma da UFPBA do Curso Superior em Técnicas de Corretagem Imobiliárias.

Irreverente é pai de Luíza, Juliana, Júnior, Daniela, Fabiana, Ana Carolina, Isabela, Mariana e Rachel. Sua prole, diga-se de passagem, agraciada com a beleza, reflete seu universo diferente, onde as paixões correram soltas. Meu irmão é assim, caracteristicamente extremista, com padrões de comportamento próprios, mas nem por isso menos amado.

Ao longo desses anos colecionei amizades. Pessoas queridas, parentes ou não, tias, tios, primas, primos com quem contei ou conto em momentos de amenidades, de necessidades, de alegria ou de sofrimento. Cada um com o seu modo de ser. 


Da época de menina destaco Fátima, uma prima muito querida e Silvana, também prima que, inclusive morou conosco. Da adolescência, Neuman, minha tia quase irmã. Dos colégios destaque para, Valdenise e sua irmã Eliane, no Colégio Nossa Senhora das Neves; Rosângela, Lúcia oliveira, Franceclaire, Ivynha no Colégio Lins de Vasconcelos. As demais perdoem minha falta de memória.

Em minha casa, já dona de minhas decisões me tornei amiga de uma pessoa fantástica. Uma senhora da idade de minha mãe, Maria do Carmo Moura, esteticista e dona de um enorme coração e que me ajudou na vigilância diária uma vez que o trabalho me mantinha de certa forma longe de meus filhos mais tempo que o desejado. Como domésticas amigas contei ainda com Helena e Vera.


No trabalho muitas são as pessoas queridas, assim e em razão da proximidade e confiança não posso esquecer Estelídia, Nabor, Graça,  Marcus na antiga FUNDAP;  Salete, Cynthia, Zilka, Rachel, Solange, Souto, Eudes (amigo desde a adolescência) na PGE e tantos que me honram com sua amizade que fica difícil enumerar sem cometer injustiças. Peço desculpas e esclareço que cabem todos dentro do meu coração.

São sessenta anos, neles um registro especial. Há cinco anos acreditava que já havia fechado um ciclo em minha vida. Que num natural declínio não mais havia espaço para outras coisas que não fossem filhos, família e trabalho.


Jamais me senti velha ou acabada. Acreditava sim que já vivera todas as emoções nesse sentido. Mas eis que, mais uma vez, a vida me surpreende. Assim, do nada, como se ouvisse a narrativa da história de outra pessoa me vi envolvida numa nova situação. Eu que já me definia como “aposentada” vi surgir em minha história um novo recomeço.

No final do ano de 2006, eis que surge alguém que passa a fazer parte de minha história. José Humberto é o seu nome. Com ele revivi um aspecto de minha vida que estava adormecido.


Recomecei a viver as situações que envolvem relações adultas. Em minhas lembranças havia a decisão de não casar novamente. Ficara com dois filhos e sempre tive a preocupação de como seria a nossa existência a partir de um novo casamento.

O novo casamento me trouxe um companheiro com virtudes e defeitos semelhantes aos meus. Claro que dois adultos acostumados a decidirem o que lhes diz respeito, invariavelmente, têm que encontrar pontos de equilíbrio para somar na relação. 


Meu marido, uma pessoa maravilhosa e que como todo ser humano por vezes tem atitudes diferentes das que seria a desejada por mim. Nada demais, situações normais que cercam duas pessoas com histórias de vida, formação, interesses e grupos familiares diferentes. José Humberto por nossas escolhas é o meu amor maduro, consciente, acredito piamente que será o meu canto do cisne.

É isso e aqui estou eu. Não vou ser otimista a ponto de definir esta como a melhor idade. Somente sei que me sinto bem. Olho para dentro de mim e não encontro erros que me constranjam, que não possam ser justificados pela conjuntura que cercava a situação. Lógico que foram erros, hoje sei que não os repetiria. Sei também que cada idade tem posturas que lhes são peculiares, as atitudes que tomamos aos 20, aos 30 ou mesmo aos 40, creio eu, jamais seriam repetidas aos sessenta. 


Mais engana-se quem me imagina como uma recatada senhora. Convivo com o tempo conforme ele vai caminhando. Fui menina, fui mocinha, fui jovem, adulta, hoje, idosa diante da Lei. Mas qualquer que tenha sido a época, em todas fui mulher, gênero feminino. Assim, continuo a vivenciar essa dádiva divina. Se não dá mais para usar biquíni, besteira, uso um maiô cuidadosamente escolhido para esconder o que não me favorece e realçar o que realmente me embeleza.

Se não posso usar os adorados sapatos vermelho de salto agulha, troco-os, conservando a cor e adaptando o salto. Se não há como ostentar aqueles maravilhosos decotes, a gente inventa, coloca transparências, uma fenda, um detalhe em renda, o importante é sentir-se bem.


Até porquê se existem limitações decorrentes da idade, nos tornamos mais sábias, Usamos nossa inteligência para driblamos o que possa nos causar restrições. Esse é um aspecto interessante dessa nova fase do nosso viver.

Se os cabelos embranqueceram, deixa-los natural é hoje “chic’. Muitas são as estrelas hollywoodiana que fizeram essa opção. Se antes era sinal de decrepitude, hoje já tem um significado de independência, rompimento com a tirania dos padrões de beleza ditado por salões e academias. Desfilo os meus me sentindo poderosa. Sim porquê aos SESSENTA NÃO ME SINTO SEXAGENÁRIA E SIM SEXY, DE NOVO. POIS SE O FUI AOS TRINTA, HOJE ME SINTO DUPLAMENTE SEXY, SEM OBRIGAÇÕES ESTÉTICAS , SEM MEDO DE SER FELIZ.


Bom essa é a minha análise, se concordam agradeço mas, se discordam  e quiserem expor suas observações estou aberta a ouvi-los.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS

REMINISCÊNCIAS E ATUALIDADES.

Quem nos idos de 1990 deixou de se emocionar com a  riqueza e profundidade de algumas célebres produções de Hollywood? Entre outros, assisti, naquela década, ao filme que considero um dos melhores que já vi. Trata-se do fantástico Sociedade dos Poetas Mortos”, produzido no ano de 1989, que teve a direção de Peter Weir nascido em Sydney, Australia, com magistral interpretação de Robin Williams e, ainda, Ethan Hawke. O filme se passa nos anos 50, trazendo um ex-aluno, que se tornara Professor de Literatura na Welton Academy, uma escola secundária e tradicional.
O Mestre, cuja visão de ensino repudia o método ortodoxo até então  empregado pela instituição, mostra-se, desde o início, avesso à rigidez de uma educação meramente destinada a repetição do que era ensinado. Nesse contexto o aluno era moldado segundo o seu educador. Não havia ambiente para o lúdico. Amoldar-se ou não a tradição era a diferença entre “ajustado e desajustado”.

O jovem professor, que confidencia aos alunos o seu desejo de ser chamado “Oh! Captain! My Captain lança um novo olhar sobre a vida e a educação, motivando-os a refletir sobre o que lhes era repassado. O filme evoca a emoção, os sentimentos verdadeiros que emergem dos textos e dos autores, provocando o alunado com a finalidade de torná-los, verdadeiramente, aprendizes na arte de viver.
Os alunos, adolescentes, cheios de vida e curiosidade, encontram naquela visão diferenciada a ruptura com um sistema acadêmico retrógrado,  autoritário que complementava a visão familiar dominante na sociedade. A simbiose da escola com o núcleo familiar podava os jovens, impedindo-os de florescerem diferentemente de seus pais. O mesmismo condenava-os a reproduzirem entendimentos, comportamentos e situações pré-estabelecidas.

Um marco, um divisor de águas, a Sociedade dos Poetas Mortos, retrata, também, um professor diferente, compromissado consigo e, com seus ideais. Um desbravador que se coloca lado a lado com os seus pupilos. Que emociona e se emociona a cada revelação obtida a partir das sugestões oferecidas e dos caminhos escolhidos. Há para o espectador a sensação de que o mestre vai construindo o seu saber juntamente com os alunos, a troca de conhecimentos, de experiências, é palpável.

O encanto, o entrosamento do mestre com seus alunos são compartilhados com a platéia quando, John Keating – Robin Williams, fala sobre a Sociedade dos Poetas Mortos. Coletividade na qual para se ter acesso, teria o candidato que ser um leitor freqüente, produzir versos, reunir-se para aprofundamento e deleite dos seus membros. O contraditório estava no fato do mestre, ex-aluno da escola, recusar-se a  dar  continuidade   aos   métodos   ali  utilizados; criar a sua própria metodologia, estimular sentimentos cunhar emoções, abandonar conceitos e preconceitos dominantes na sociedade.

Surpreendente no seu desenrolar, o filme dá aos alunos a sensação de que devem viver o dia de hoje como se fosse o último de suas vidas, com emoção. - “Carp Diem” propõe o Mestre. O mestre sugere a quebra de protótipos educacionais, John Keating, propõe outra conjuntura e mudanças de conceitos sobre o universo;  tece um  paralelo entre a vida efetivamente vivida e a ideal, aquela que todos deveriam viver. Acende no emocional, de cada um, concepções diferenciadas, sentimentos novos, idéias novas.


 O traço da tragédia fica por conta da morte do personagem Neil Perry, que sai de cena exatamente quando a vida lhe oferece probabilidade de proveito a cada momento, cultivando afinidade direta com a frase já referida: Carpe Diem (aproveite o dia). 
Ela é imolada em suicídio sob o pretexto mais fortemente narrado no filme, à brutalidade versus a vontade individual, essa, acrescida às injunções profissionalizantes, educacionais, capitalistas,  que  caracterizavam, já naquela época,  a sociedade global mundial.
Durante todo o espetáculo, é mostrado o valor das emoções humanas que se sobrepõem aos limites impostos pela sociedade, o valor atribuído a cada um é em razão de sua essência e não em aceitação a regras cegas, é o rompimento com o estático para que ocorra a renovação.
 Todavia, a manifesta transgressão de princípios, desvendada como sendo a linha mestra da história, entra em rota de colisão com a própria constituição da Sociedade dos Poetas Mortos, pela obrigação da leitura, da produção intelectual, da discussão com data e horário previamente definidos, numa sociedade cultuadora do intelecto, portanto e coerentemente, de livre acesso e permanência, sem metas a atingir.
A Sociedade ressalta criações de poetas famosos bem como dos participante/personagens, que se tornam inovadores e incitadores de atuações e pensamentos. Discutindo e analisando famosos, a Sociedade avalia o poeta Norte-americano Walt Whitman, precursor do verso livre naquela nação, utilizando para si a fala do poeta que chamava o  “captain” referindo-se a  Abraham Lincoln. Ainda, entre os grandes são citados no filme Shelley e Shakespeare.
A beleza do filme apenas é superada pelo extraordinário trabalho de Robin Williams que transforma um professor atemporal, atípico e contraditório numa figura humana incomparável, capaz de arrancar de dentro de nós momentos mágicos de emoção e prazer. Seu rosto, seus gestos e expressões levam o espectador a mergulhar naquele universo, a se transformar num adolescente, rompendo barreiras, reconciliando-se com suas aspirações e naturais sentimentos de rebeldia.

O ator, de inigualável atuações, nos conduz a um mundo novo. Com ele caminhamos floresta adentro, com a sensação do frio rodeando nosso corpo, quase podemos sentir a brisa suave soprando em nossos ouvidos. Os passos sobre folhas secas produzindo estalos e sobressaltos. A companheira inseparável de Keating, a liberdade abrindo suas portas acolhe os caminhantes em clareiras, cavernas e, sob luz tremulante, permite  que se desarrolhem os ouvidos da alma, que se colham a verdadeira poesia, bebendo da fonte primeira, a natureza, que envolve poetas e poemas, derramando  gotas mágicas de sentimentos.
É tão forte o envolvimento, ator, personagens e espectadores,  que nos vemos “presentes” , sofrendo com a pressão exercida pelo genitor do jovem Neil Perry, ao tomar conhecimento da decisão em seguir seus sentimentos, tornar-se um amante das letras, um poeta. A truculência da ameaça de tirá-lo da escola e matriculá-lo no colégio militar, leva-o por fim em sua vida. Nessa hora sentimo-nos impotentes e frustrados pela impossibilidade de mergulhar na história, modificar esse acontecimento que burla a nossa expectativa de que tudo vá mudar.
John Keating nos leva a repensar a nossa técnica pedagógica, o modelo de escola desejado e, especialmente, sobre a formação de cidadãos conscientes, coerentes, integrados, comunicativos, que se apercebam de suas potencialidades e percebam os demais. A proposta é construir criaturas humanas que não sejam permanentemente tolhidas em suas emoções e que possam exercitar suas emoções, seus sentimentos sem culpa, sem medos.

MAS, NÓS TAMBÉM TEMOS A NOSSA  SOCIEDADE DOS POETAS  MORTOS.

Nela encontramos beleza, amor, dor, perdão, paixão e afago entre tantos sentimento e emoções que a enriquecem. Poetas eruditos, cantando o amor, a liberdade, a arte, a vida. Poetas que conviveram com a morte como se essa fosse a sua amante, sua companheira. Poetas que não freqüentaram escola, academias ou quaisquer outras instituições. Poetas matutos que usam uma linguagem colorida, afetiva em cordéis ou não. Poetas que sequer sabiam ler mas que distribuíam versos e amor em palavras simples e sábias. Poetas bem vestidos, limpos, lavados. Poetas sujos, trazendo nas vestes e no corpo a areia das noites mal dormidas nas praias. Poetas convencionais, Poetas com permissão poética para serem e dizerem segundo as suas necessidades. Poetas com traços tão diferenciados que seria impossível enumerá-los.
A nossa terra é pródiga em talentos. A poesia nos deu o homem do século: Augusto dos Anjos; a rima de Jomar Souto;  a genialidade de Lúcio Lins; a vocação de  Ascendino Leite; a poesia matuta mas em nada inferior de Zé da Luz, e tantos outros. Infelizmente, no momento presente podemos dizer que cresceu a nossa Sociedade dos Poetas Mortos. Nós, Paraibanos, vimos partir nosso grande Poeta. Um homem que inquietou-se em busca de respostas, que viveu tão intensamente que se consumiu e foi consumido por sua paixão pela vida.
Ronaldo Cunha Lima, nascido na cidade de Guarabira. Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, membro das Academias Paraibana e Campinense de Letras, político – Democrata em sua essência,  de projeção nacional, ocupante de todos os cargos políticos de seu Estado natal,  viveu, em toda a sua extensão a sua veia poética, notabilizando-se ao chegar ao final de conhecido programa de televisão denominado “Sem Limite”, da extinta Rede Manchete, apresentado pelos saudosos J. Silvestre e Luís Armando Queirós, onde respondia sobre a vida e obra de Augusto dos Anjos, o paraibano do século, em verso. Pai de  Cássio,  Gal  e Savigny.
Não quero falar sobre Ronaldo. Não sobre o que se foi. A sua obra como Político, Poeta, Escritor, Homem Público, falará por ele, contará sua história, suas dores, seus amores, seus humores, enfim, dirá a todos nós quem foi o poeta Ronaldo Cunha Lima, permeando a saudade com um legado rico, profundo,  pontilhado de fé, emoção e sentimento. Um homem que assumiu o “Carp Diem” e, em homenagem a essa figura singular desfrutemos de:

RONALDO EM VERSO E PROSA - DOSE HOMEOPÁTICA .

HABEAS PINHO -

 Corria o ano de 1955, na cidade de Campina Grande, na Paraíba, onde jovens amigos,  boêmios,  faziam  serenata durante a madrugada do mês de junho, quando foram surpreendidos com a chegada da polícia que apreendeu o violão.
Frustrado, o grupo buscou o trabalho do
Jovem Advogado Ronaldo Cunha Lima, naquela ocasião recém-formado, conhecido e reconhecido, também, como um admirador da seresta. Como bom conhecedor da alma humana, ele buscou o Juiz de Direito competente,  intercedendo pela liberação do violão. O  Magistrado mostrou-se compreensivo dizendo que o livraria desde que lhe fosse peticionado, em forma de verso. Ronaldo, conforme a exigência judicial  requereu em Juízo, em verso,  para que fosse liberado o violão. Sua peça tomou a denominação "Habeas-Pinho" ou, para alguns “Hábeas-Corpus para um violão” e adorna escritórios advocatícios, bares de praias, quiosque, barraquinhas no Nordeste.
Essa é a famosa petição:
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara desta Comarca:
O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção
Não é faca, revólver nem pistola,
É simplesmente, doutor, um violão.

Um violão, doutor, que na verdade,
Não matou nem feriu um cidadão,
Feriu, sim, a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.

O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade,
Ao crime  ele nunca se mistura,
Inexiste entre eles afinidade.

O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam as mágoas e que povoam a vida
Sufocando suas próprias dores.

O violão é música e é canção,
É sentimento de vida e alegria,
É pureza e néctar que extasia,
É adorno espiritual do coração.

Seu viver, como o nosso, é transitório,
Porém seu destino se perpetua,
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.

Mande soltá-lo pelo Amor da noite,
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas leves e sonoras.

Libere o violão, Dr. Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito,
É crime, porventura, o infeliz
cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

Será crime, e, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
perambular na rua um desgraçado
derramando ali as suas dores?

É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento,
Juntando esta petição aos autos nós pedimos
e pedimos também DEFERIMENTO.

Autor: Ronaldo Cunha Lima, advogado.


O julgador, Dr. Arthur Moura, poeta e admirador dessa maravilhosa arte, apoderando-se, também, da rima, sentenciou sem afastar-se do tom:




"Para que eu não carregue remorso no coração,
Determino que seja entregue ao seu dono,
Desde logo, O malfadado violão! “

Recebo a Petição escrita em verso
E
, despachando-a sem autuação,
Verbero o ato vil, rude e perverso,
Que prende, no cartório, um violão.

Emudecer a prima e o bordão,
Nos confins de um arquivo em sombra imerso
É desumana e vil destruição
De tudo, que há de belo no universo
.
Que seja Sol, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada
Num esbanjar de lágrimas sonoras.

Se grato for, acaso ao que lhe fiz,
Noite de lua, plena madrugada,
Venha tocar à porta do Juiz. 


TERCETOS - 
Extraídos de: Lima, Ronaldo Cunha. BREVES E LEVES; tercetos e outros poemas. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2004. 287 p.




NATUREZA MORTA

A fama do pintor, já não importa.
A natureza não existe morta:
o quadro é que parece não ter vida.

O MAR
                                              O mar corteja a praia e, uma a uma,
                                               as ondas pousam perolas de espuma
                                                 sobre seu ventre branco, umedecido.


A CARTA

Aquela carta, fiz bem em escondê-la.
Sinto , as vezes, vontade de retê-la
mas tenho medo de querer rasgá-la.

INDUÇÃO

                                                  A dúvida, afinal, esclarecida:
                                                   ela jamais se foi da minha vida.
                                                    Minha vida, sem ela, e que se foi.

                           DESPENHADEIRO

Porque eu te amei o quanto pude,
em dimensões de abismo e de altitude
o nosso amor se fez despenhadeiro.


MODORRA

Ancorado na barra de mar morto,
do navio um marujo espia o porto,
como quem se perdeu do horizonte.


                                                              AUSÊNCIA

Renasces, recompões e me retornas
paisagens mortas e lembranças mornas
mas tu mesma não vens para vivê-las.

O QUE RESTOU DE NÓS

Além do adeus, da lágrima velada,
do nosso amor se não restou mais nada,
fica, entretanto, o que restou de nós.


                                            ALHEAMENTO

                                          A vida não me alheie no absorto
                                                                     enquanto eu não me encontre, vivo ou morto,
                                                                     e, estando vivo, enquanto eu não me esqueça.

                                      SONHOS

                                                    Se nas horas dos dias de crescer
                                                       eu sonhava com o que queria ser,
                                                            hoje sonho em ter sido o que não fui.

TRAVESSIA

Ondas navegadas
marulham, cansadas,
nas encostas do cais.


POUCO A POUCO

                                                Assisto triste, aflito, quase louco
o nosso amor morrendo pouco a pouco                                                                                                      
                                                                  e meu querer sem poder fazer mais nada.
  
              
      ESPELHO

                        O espelho e o meu castigo.
                   Nele eu pareço comigo,
                            não com o que penso que sou.





O DISCURSO EM DEFESA DA LÍNGUA PORTUGUESA.
SENADO FEDERAL -12 DE NOVEMBRO DE 1998
Necessidade de regulamentação que preserve a língua nacional do avanço dos estrangeirismos, principalmente dos anglicismos, registrados em grande número na última edição do vocabulário ortográfico da língua portuguesa editado pela Academia Brasileira de Letras
"A língua portuguesa, como forma oficial de expressão, constitui patrimônio cultural brasileiro e, por isso, incumbe ao Poder Público e à comunidade o dever de promovê-la e protegê-la, em especial neste momento em que ela vem sofrendo constante e preocupante invasão de palavras e expressões estrangeiras. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, em sua edição mais recente, acresceu nada mais, nada menos que seis mil novas palavras, em sua maioria de origem inglesa.
O Presidente da Academia Brasileira de Letras, Professor Arnaldo Niskier, em artigo publicado no jornal A Folha de S. Paulo, edição de 15 de janeiro do corrente ano, sob o título "Na ponta da língua inculta e bela", cuja transcrição nos Anais da Casa desde já requeiro, produziu excelente e oportuna defesa da língua Pátria, advertindo-nos do risco da invasão estrangeira e da falta de cuidados que quase todos temos ao falar e escrever a nossa língua.
Rachel de Queiroz, em artigo publicado no jornal Correio Braziliense, de maio último, já advertia para o bilingüismo emergente. É tempo de o Brasil cuidar melhor da língua pátria. Nem socializar os solecismos, nem elitizar os anglicismos. Nem a falsa cultura dos termos importados, nem a linguagem incorreta de erros primários. Este discurso tem o sentido de advertência e objetivo de apelo. Apelo ao Ministro da Educação e ao Ministro da Cultura para que, ouvida a Academia Brasileira de Letras, seja constituída uma comissão para o estabelecimento de regras para preservação e prestígio da língua portuguesa.
A maioria dos povos faz questão de preservar seu idioma. Quando a possibilidade de deterioração se torna muito grande, os legisladores intervêm para tentar impedir que isso ocorra. É o caso da França, que editou a Lei nº 94.665, de 4 de agosto de 1994, buscando disciplinar e prestigiar o uso da língua francesa.
No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 2.893, de 1997, do eminente Deputado Remi Trinta, dispondo sobre o emprego do idioma oficial brasileiro, cuja aprovação rápida seria valiosa colaboração ao restabelecimento do nosso prestígio lingüístico.
Quando abordo as questões de nossa língua, sempre me lembro da minha época de escola.
Nos meus tempos de ginásio, em Campina Grande, estudei no velho e querido Colégio Diocesano Pio XI, parada obrigatória no itinerário das minhas lembranças e nas andanças das minhas saudades. Ali, fui aluno, aprovado com dificuldades, e, depois, fui professor, escolhido por generosidade. Um dia, o Professor Raimundo Gadelha Fontes, que nos ensinava Português, passou como dever de casa a leitura de um soneto de Olavo Bilac, intitulado Língua Portuguesa, que começa assim:
"Última flor do Lácio, inculta e bela, és, a um tempo, esplendor e sepultura"
Na sala de aula, o debate despertou em nós, alunos, o maior interesse pela língua pátria. O Professor nos falou de neologismo e de estrangeirismo, principalmente os anglicismos e os galicismos, palavras e expressões inglesas e francesas que entram no vocabulário do nosso cotidiano. Cada aluno teria que gravar, pelo menos, dez nomes franceses já incorporados ao nosso idioma. Para facilitar a memorização, preferi formar onze nomes, formando um time de futebol: abajur, chofer e butique; laquê, bisturi e filé; bureau, buquê, boné, toalete e purê.
A influência francesa, antes predominante, foi, aos poucos, abrindo espaço para os termos ingleses e é, hoje, cada vez mais crescente o anglicismo dentro do nosso idioma. Seja qual for o campo de atividades, o uso de palavras estrangeiras, notadamente inglesas, já se torna comum.
Na área dos esportes, por exemplo (e esporte já é uma palavra de origem inglesa), quase todas as práticas desportivas têm nome originário do inglês: futebol, tênis, basquetebol, vôlei, golfe, surfe, handebol, etc.
No ramo do Direito, também não é diferente. O writ, sucedâneo do mandamus latino, abriu porta para a common law, o due process of law, o impeachment e ainda a joint venture, o franchising, o leasing, o copyright, a holding, o lobby, a trading.
Com a globalização da economia, ficou mais fácil para o economês invadir o português: e tome open market, over night , spread, cash, fob, cif, trust, dumping, lockout, royalties, made in Brazil, hot money, etc. Já existe, inclusive, um Dicionário de Termos Financeiros e de Investimento, com mais de mil expressões inglesas, que me foi cedido ontem pelo Senador Esperidião Amin.
Na música, importamos o jazz, o swing, o reggae, o rock, o twist, o rap, o funk, a música country, e até o Falcão, nosso irreverente cantor, de forma cômica e irônica, dá ênfase ao inglês em suas letras, cantando: I´m not dog no (eu não sou cachorro, não!).
Na informática, a moda agora é site, mouse, byte, home page, shift, chip, e-mail, on line, software, game, afora os neologismos como deletar, formatar, navegar e clicar.
Hoje em dia, é esnobe, é chique, é VIP (very important person) usar palavras inglesas. Até as casas comerciais estão preferindo as denominações estrangeiras, mesmo que os produtos à venda sejam nacionais. No interior do Nordeste, um restaurante (e restaurante é nome francês), cuja especialidade é carne assada com macaxeira, adotou o nome de Steak Grill.
A invasão de termos estrangeiros tem sido tão intensa que ninguém estranharia se eu fizesse aqui o seguinte relato do meu cotidiano:
Fui ao freezer, abri uma coca diet; e saí cantarolando um jingle, enquanto ligava meu disc player para ouvir uma música new age.
Precisava de um relax. Meu check up indicava stress. Dei um time e fui ler um bestseller no living do meu flat. Desci ao playground; depois fui fazer o meu cooper. Na rua, vi novos outdoors e revi os velhos amigos do footing. Um deles comunicou-me a aquisição de uma nova maison, com quatro suites e até convidou-me para o open house. Marcamos, inclusive, um happy hour. Tomaríamos um drink, um scotch, de preferência on the rocks. O barman, muito chic, parecia um lord inglês. Perguntou-me se eu conhecia o novo point society da cidade: o TimeSquare, ali no Gilberto Salomão, que fica perto do Gaf, o La Basque e o Baby Beef, com serviço a la carte e self service. Preferi ir ao Mc Donald’s, para um lunch: um hamburger com milk shake. Dali, fui ao shopping center, onde vi lojas bem brasileiras, a começar pelas Lojas Americanas, seguidas por Cat Shoes, Company, Le Postiche, Lady, Lord, Le Mask, M. Officer, Truc’s, Dimpus, Bob’s, Ellus, Arby’s, Levi’s, Masson, Mainline, Buckman, Smuggler, Brummel, La Lente, Body for Sure, Mister Cat, Hugo Boss, Zoomp, Sport Center, Free Corner e Brooksfield. Sem muito money, comprei pouco: uma sweater para mim e um berloque para a minha esposa. Voltei para casa ou, aliás, para o flat, pensando no day after, o que fazer? Dei boa noite ao meu chofer, que, com muito fair play, respondeu-me: Good night.
Senhoras e senhores, muito obrigado, ou, se preferirem, thank you very much!"
Esta é uma amostra milimétrica do Advogado, do Poeta, do Intelectual, digno representante desta Paraíba na "Sociedade dos Poetas Mortos".